sexta-feira, 5 de maio de 2017

Palocci, Edson Fachin, a candidata Cármen Lúcia e o baguncismo

É evidente que não faz sentido transferir para o pleno a decisão sobre habeas corpus ao ex-ministro da Fazenda

Não está marcada a data do julgamento de perdido de habeas corpus do ex-ministro Antônio Palocci. Para que se entenda a demagogia de sotaque populista de Edson Fachin e da presidenciável indireto-direta Cármen Lúcia, presidente do STF, o leitor precisa levar certos fatos em consideração. Vamos a eles.
Fachin, todo mundo sabe, combinou a decisão com Cármen. Não é a primeira vez que a presidente do STF opta por cair nos braços do alarido. Com a homologação de baciada das delações da Odebrecht, viu-se o mesmo. A ministra está agora num esforço de popularização de sua imagem.
No programa “Conversa com Bial”, que estreou na terça, na Globo, Cármen, referindo-se à rotina do colégio interno onde estudou, criticou “o tanto de sininho para fazer isso e para aquilo”. A plateia riu. E mais ainda quando a conversa assumiu, assim, ares fesceninos, mas sem nunca perder a toga: “Quando chegou na minha adolescência, que a gente namorava, e alguém dizia assim: ‘Olhe, aquele homem me fez escutar sininhos’. E eu dizia: ‘Nossa! Se me fizer escutar sininhos, eu lembro da madre superiora. Não vai dar, comigo tem de ouvir outras coisas, outras histórias, ainda que mentirosas”.
Falemos de verdadesNum ato extremamente prudente, o presidente Michel Temer houve por bem indicar o substituto de Teori Zavaski só depois que o tribunal escolhesse o novo relator do petrolão. E por que o fez? Porque, segundo o Regimento Interno, aquele que assume a vaga aberta com a morte ou renúncia de um ministro fica com os seus processos. Logo, o nome indicado por Temer seria o… relator do petrolão. Imaginem o barulho!
Muito bem. O Tribunal está dividido em turmas. Isso só faz sentido se cada uma tiver as prerrogativas do Supremo inteiro, exceção feita aos casos já previstos em que se obriga o voto do pleno. Se não fosse assim, não teríamos o Supremo votando coisas sobre o petrolão, mas apenas “Meio Supremo”.
Quando Temer decidiu que só indicaria o nome para a vaga aberta depois de definido o relator, coube a Cármen Lúcia encaminhar uma solução que surgiu neste blog. Sim, é isso mesmo. Ainda no dia 19, data da morte de Zavascki, escrevi:
Há outra leitura absolutamente consistente e hígida desse trecho do regimento. Em termos de relatoria do petrolão, a “vaga” é aquela que está aberta na Segunda Turma. Foi nesse grupo de cinco ministros que se deu o sorteio.
Assim, um ministro da Primeira Turma poderia ser indicado para a vaga na Segunda, e o Regimento se cumpriria plenamente. Quem são eles? Roberto Barroso, Marco Aurélio, Luiz Fux, Rosa Weber e Edson Fachin.
Nesse grupo, o nome que rende menos polêmica é o de Edson Fachin.
E assim se fez. Observem: de tal sorte se entende que a turma não é metade do Supremo, mas representa o todo, que não se cogitou a hipótese de eventual redefinição. Optou-se por completar o grupo.
Nem poderia ser diferente: mudança no Regimento Interno do STF operada no dia 28 de maio de 2014 retirou do pleno a competência para julgar os que têm foro no tribunal, excetuando-se os presidentes dos Poderes e o procurador-geral da República. A decisão foi tomada por unanimidade. Roberto Barroso e Celso de Mello defenderam que até mesmo esses casos fossem submetidos às turmas.
Então ficamos assim. Segundo Fachin e a ministra que não gosta de ouvir sininhos, a turma é tão forte que lhe cabe, sim, a relatoria. Mas não é hígida o bastante para julgar um pedido de habeas corpus…
Excitando a turbaLamento dizer, mas Fachin e Cármen Lúcia estão dando corda àqueles que acham que existe uma conspiração para soltar Antônio Palocci, o que o impediria de fazer delação premiada.
É um raciocínio de tal sorte asnal que começa por ignorar o óbvio: se o petista fizer delação, pegará uns dois ou três anos de cadeia em prisão domiciliar. Se não o fizer, corre o risco de ser condenado a dezenas de anos. SERÁ MESMO QUE, POR CAUSA DE UM SIMPLES HABEAS CORPUS (QUE LHE GARANTIRIA LIBERDADE APENAS PROVISÓRIA), PALOCCI TROCARIA UNS DOIS OU TRÊS ANOS DE CADEIA POR, SEI LÁ, UNS SEIS OU SETE EM REGIME FECHADO?
Pode-se acusar o ministro de um monte de coisas. Mas nunca ninguém havia dito até agora ser ele um idiota. Acho que não é.
Já se fez antesO próprio Zavascki recorreu ao pleno duas vezes: por ocasião da prisão de Delcídio do Amaral, então senador, e do afastamento de Eduardo Cunha da Presidência da Câmara. Bem, no segundo caso, o então deputado comandava uma das Casas do Legislativo. No outro, tratava-se de uma decisão das mais polêmicas: no exercício do mandato, um parlamentar só pode ser preso em flagrante. Uma escuta previamente combinada com órgãos de investigação não parece caracterizar flagrante… Fez-se ali uma heterodoxia. E não! Isso não quer dizer que Delcídio não merecesse. Falo de leis.
A questãoVenham cá: então uma Turma do Supremo, que detém as prerrogativas do pleno em processos dessa natureza, pode condenar alguém a dezenas de anos de cadeia, mas não pode decidir sobre um simples habeas corpus? É ridículo!
Isso corresponde a apostar na bagunça e na desinstitucionalização. De resto, até onde sei, Palocci fará delação esteja solto ou preso. E se receber o HC e não fizer o acordo? Bem, pior para ele.
Ademais, Fachin precisa definir os critérios para recorrer ou não ao pleno, certo? Quais são? Ou ele vai arbitrando caso a caso?
EncerroAh, sim: você quer que Palocci passe muitos anos na cadeia? Bem, a única forma de isso acontecer é ele não fazer delação premiada (na hipótese de o MPF provar as acusações que faz). Como? Você acha que a concessão do habeas corpus o impediria de fazer delação? Bem, se é assim, então torça por isso. A menos que você queira que ele pegue apenas uns dois ou três aninhos.
Essa conversa sobre habeas corpus impedir delação é só mais uma das teses estúpidas lançadas pela direita xucra para mobilizar a militância de Facebook. As esquerdas, obviamente, agradecem. O cenário de degeneração institucional sempre lhes será útil.
Do Portal Veja.com

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